Cinzas e papel


O gosto amargo invadiu minha garganta e meus olhos se encheram de lágrimas. Nunca fumei, e nunca havia colocado um cigarro na boca, até que aceitei o convite de um estranho para fumar. 

Estávamos numa festa, eu estava num dia ruim, queria quebrar a rotina com algo que nunca havia feito. Queria que meus problemas virassem fumaça e cinzas para que voassem para longe. E aceitei aquele misterioso convite para uma noite de rebeldias. 

Odiei o gosto da nicotina e quase me afoguei quando a fumaça fluiu pelas minhas narinas. Jurei que iria vomitar nos pés do homem que ria do modo descoordenado que eu segurava o cigarro. Eu não havia nascido para o fumo, desde criança repudiava o odor e a fumaça, e agora eu possuía certeza de que fumar era horrível. Pelo menos para mim. 

Admito que aceitar aquele convite me revigorou, me senti ousada, incorreta e vulgar. Eu precisava sentir, explorar facetas ocultas, quebrar as barreiras do “nunca irei fazer isso”. Eu fiz e não me arrependo, mesmo que não seja algo para se orgulhar, era algo exclusivamente pessoal. 

O cigarro pareceu durar horas nos meus dedos, e a cada tragada eu abria meu coração para um estranho de olhos verdes e cabelos escuros. Ele mandava eu ir com calma, enquanto eu tagarelava e fazia caretas soprando a fumaça pra o alto. Estávamos sentados na sarjeta como se nos conhecêssemos a anos naquela escuridão.

Não demorou para que a bituca estivesse fincada no cordão da calçada e eu estivesse aos beijos com o homem misterioso. Eu estava levemente alcoolizada e o aroma ruim estava impregnado na minha boca e nas minhas roupas, mas nada abafava o aroma amadeirado do rapaz de roupas escuras. Honestamente, creio que havia acertado na escolha do cigarro. Não fumaria novamente, mas estava com um envolvente mistério nos braços e o mundo girou.
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